
Os Manic Street Preachers são uma banda de rock invulgar, não por causa de alguma extravagância experimentalista mas por serem radicalmente clássicos, resistentemente clássicos. E nos dias que correm, já ninguém o é. Ou pelo menos da forma persistente e crente com que os Manics se apresentam, não há quem. O mérito da sua peculiaridade não está tanto no querer mas sim no conseguir ser. O formato clássico rockeiro do grupo de James Dean Bradfield é uma obstinação, um triunfo que dura vinte anos, e não uma casmurrice.
Houvesse mais meia-dúzia de bandas com a política e, palavra importante, a qualidade dos Manics neste mundo, e o rock, tal e qual como o conhecíamos, poderia ter prolongado o seu prazo de validade até aos dias de hoje, com os dias gloriosos da rádio em polvorosa e massas de multidão a acorrerem aos estádios e aos grandes pavilhões para verem a sua banda eleita. Os Manic Street Preachers trabalham hoje como se esse mundo ainda existisse e é isso que lhes dá uma identidade única. E de certo modo conseguem esse "furo", só que agora esse mundo é uma recriação exclusiva dos Manics.
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Chegados agora ao nono álbum após normais e anormais oscilações, o grupo recupera 13 dos últimos escritos do guitarrista desaparecido Richey Edwards para as 13 faixas do disco novo. É esse o factor noticioso nº1 de Journal for Plague Lovers, aquilo que se deve escrever numa sinopse. Mas com o tempo, e ultrapassados os aspectos factuais, o que vai sobrar de Journal for Plague Lovers vão ser as maravilhosas canções que ali constam, uma colectânea explosiva de grandes baladas e de rock inflamado - quase todos os temas bons candidatos a singles; conseguir-se-á destacar algum?, não consigo - que dão razão e saúde à crença tradicionalista da banda.
Conforme o álbum nos relembra, não há quase banda pop nenhuma que tenha no vocalista uma voz tão expansiva e calorosa como a de James Dean Bradfield. E deve ser difícil encontrar alguém que durante quase vinte anos mantenha viva na alma uma raiva punk tão arrebatadora quanto ele. Nicky Wire, que com Richey Edwards compunha a facção glam-poética da banda, aceitou prescindir do seu papel activo de letrista em favor da poesia inédita do seu velho amigo desaparecido que une todo álbum. Mas é o baterista Sean Moore que, no mínimo, merece tantos créditos em Journal for Plague Lovers quanto James, Nicky e Richey. Moore consegue desdobrar-se pelos bombos como se fosse um homem-polvo com oito membros; não oito tentáculos, mas quatro braços e quatro pernas herculeamente disponíveis para bombear batidas com as baquetas e os pedais. É, também, o trabalho notável do baterista que dá sentido ao que representa "Journal for Plague Lovers": um ponto intermédio entre a sonoridade dos primeiros álbuns (sobretudo os aguerridos Generation Terrorists e Holy Bible) e um tempo mais maduro e desapressado (reflectido em obras como This Is My Truth Tell Me Yours e Lifeblood).

Os Manic Street Preachers não têm pudores estéticos e por isso têm uma margem musical tão larga: ligam The Clash com Guns N' Roses (como acontece no álbum de estreia, Generation Terrorists), e ABBA com Joy Division (como se pode ouvir no maravilhoso e demasiado irreconhecido Lifeblood), com uma coesão só possível na banda galesa. Em Journal for Plague Lovers, a banda que venera o trabalho da pintora Jenny Saville (ao ponto de usar um dos seus trabalhos para capa do disco) é a mesma que vai em busca de um rock-FM orelhudo e fresco, sem nunca destoar. É também por isso que este é um álbum enorme. (Columbia, 2009)
Artigo publicado no site Cotonete.
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