domingo, 24 de maio de 2009

EXCITAÇÃO DA SEMANA: MANIC STREET PREACHERS, «JOURNAL FOR PLAGUE LOVERS»


Os Manic Street Preachers são uma banda de rock invulgar, não por causa de alguma extravagância experimentalista mas por serem radicalmente clássicos, resistentemente clássicos. E nos dias que correm, já ninguém o é. Ou pelo menos da forma persistente e crente com que os Manics se apresentam, não há quem. O mérito da sua peculiaridade não está tanto no querer mas sim no conseguir ser. O formato clássico rockeiro do grupo de James Dean Bradfield é uma obstinação, um triunfo que dura vinte anos, e não uma casmurrice.

Houvesse mais meia-dúzia de bandas com a política e, palavra importante, a qualidade dos Manics neste mundo, e o rock, tal e qual como o conhecíamos, poderia ter prolongado o seu prazo de validade até aos dias de hoje, com os dias gloriosos da rádio em polvorosa e massas de multidão a acorrerem aos estádios e aos grandes pavilhões para verem a sua banda eleita. Os Manic Street Preachers trabalham hoje como se esse mundo ainda existisse e é isso que lhes dá uma identidade única. E de certo modo conseguem esse "furo", só que agora esse mundo é uma recriação exclusiva dos Manics.

Chegados agora ao nono álbum após normais e anormais oscilações, o grupo recupera 13 dos últimos escritos do guitarrista desaparecido Richey Edwards para as 13 faixas do disco novo. É esse o factor noticioso nº1 de Journal for Plague Lovers, aquilo que se deve escrever numa sinopse. Mas com o tempo, e ultrapassados os aspectos factuais, o que vai sobrar de Journal for Plague Lovers vão ser as maravilhosas canções que ali constam, uma colectânea explosiva de grandes baladas e de rock inflamado - quase todos os temas bons candidatos a singles; conseguir-se-á destacar algum?, não consigo - que dão razão e saúde à crença tradicionalista da banda.

Conforme o álbum nos relembra, não há quase banda pop nenhuma que tenha no vocalista uma voz tão expansiva e calorosa como a de James Dean Bradfield. E deve ser difícil encontrar alguém que durante quase vinte anos mantenha viva na alma uma raiva punk tão arrebatadora quanto ele. Nicky Wire, que com Richey Edwards compunha a facção glam-poética da banda, aceitou prescindir do seu papel activo de letrista em favor da poesia inédita do seu velho amigo desaparecido que une todo álbum. Mas é o baterista Sean Moore que, no mínimo, merece tantos créditos em Journal for Plague Lovers quanto James, Nicky e Richey. Moore consegue desdobrar-se pelos bombos como se fosse um homem-polvo com oito membros; não oito tentáculos, mas quatro braços e quatro pernas herculeamente disponíveis para bombear batidas com as baquetas e os pedais. É, também, o trabalho notável do baterista que dá sentido ao que representa "Journal for Plague Lovers": um ponto intermédio entre a sonoridade dos primeiros álbuns (sobretudo os aguerridos Generation Terrorists e Holy Bible) e um tempo mais maduro e desapressado (reflectido em obras como This Is My Truth Tell Me Yours e Lifeblood).

Os Manic Street Preachers não têm pudores estéticos e por isso têm uma margem musical tão larga: ligam The Clash com Guns N' Roses (como acontece no álbum de estreia, Generation Terrorists), e ABBA com Joy Division (como se pode ouvir no maravilhoso e demasiado irreconhecido Lifeblood), com uma coesão só possível na banda galesa. Em Journal for Plague Lovers, a banda que venera o trabalho da pintora Jenny Saville (ao ponto de usar um dos seus trabalhos para capa do disco) é a mesma que vai em busca de um rock-FM orelhudo e fresco, sem nunca destoar. É também por isso que este é um álbum enorme. (Columbia, 2009)

Artigo publicado no site Cotonete.

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