Muito graças ao estímulo da criação da MTV (em 1982), os programas de música pop invadiram tudo o que fosse canais de televisão durante os anos 80, ainda por cima em horários acessíveis (como os finais de tarde).
Tratando-se de uma época fértil para a pop em figuras excêntricas, a invasão visual era bárbara sob o ponto de vista dos menos avisados.
O que poderia achar a avózinha que tricotasse a bela camisolinha de lã para o seu neto diante de um pequeno ecrã que exibisse uma figura em êxtase como Limahl (dos Kajagoogoo), com o seu cabelo multicolor (loiro em cima, quase preto junto às orelhas), o seu penteado punk de cabelos espetados até ao céu e a sua voz esforçadamente esganiçada a cantar o belo "Never Ending Story"? O que poderia pensar a velhinha de uma coisa daquelas afinal? Que aquele já não era o seu tempo, que aquele já não era o seu planeta, ou que simplesmente Limahl vinha de outro (e talvez viesse mesmo).
Mas Limahl estava longe de ser o único vistoso do seu tempo. A maquilhagem e a voz afeminadas de bandas como os Ultravox ou os Human League, com os seus ares extra-terrestres, baralhavam os mais agnósticos. Perante uma banda como os Culture Club, as dúvidas eram ainda maiores ao se ver a figura transvestida do seu vocalista Boy George no videoclip "Karma Chameleon", situado num imaginário aparentemente inocente do Mississippi do século XIX.
O choque visual aumentava com a imagem bem menos ambígua dos Frankie Goes to Hollywood, com a sua iconografia gay de dançarinos de bigode, vestindo guarda-roupas escuros de couro, das boinas às camisolas de alças e às calças. A mensagem de êxitos como "Relax" era explícita quanto ao conteúdo de um orgulho diferente e encurtava caminho na mudança das mentalidades, à semelhança do que aqui acontecia com António Variações e com a sua imagem de ave rara, enquanto unia na mesma canção Braga a Nova Iorque e conquistava justamente os corações dos portugueses. Os Soft Cell, os Erasure e os Communards, com a sua imagem arrojada, também ajudaram a popularizar uma forma de vida diferente.
Os hard-rockers
Os anos 80 foram também uma época de boom para a malta de cabelos comprimidos mais romântica: falamos dos hard-rockers que abriam o coração e a também camisa, nunca desvalorizando a musculada peitaça. No campo do hard-rock sentimentalão, os Whitesnake eram uns campeões, cantando "Is This Love" e baladas afins, recrutando mulheres sensuais e uma cama para a cenografia, tomando todas as diligências para que o vídeo fosse funcionasse minimamente dentro dos domínios do tórrido. Mas a competição era aguerrida: que o digam os mais batidos Def Leppard e Scorpions, ou os mais caloiros Bon Jovi. Os Europe não se ficavam atrás e preenchiam, aliás, todos os parâmetros do género: melodias choramingas, algumas pancadas megalómanas (palcos gigantes ou uma bateria do tamanho de um navio de guerra), e coreografias colectivas de cabelos compridos ao vento no momento sagrado dos solos de guitarra.
Os supra-sumos da excentricidade
Quando se fala dos anos 80, nada é tão impressionável como os dois nomes que se vão seguir. Desafiaram uma nova adjectivação como ninguém: classificá-los de divertidos ou de hediondos parecia insuficiente, perante uma imagem e um som para lá dos limites da normalidade.
Para os que se tinham irritado com os ABBA na década anterior, mal sabiam que vinha aí um fenómeno bem mais aterrador: os germânicos Modern Talking. Mal o vocalista moreno começava a cantar, o guitarrista loiro aproximava-se da objectiva da câmara para o acompanhar nos movimentos dos lábios. Era uma imagem de marca e nunca lhes faltava um sorriso. Mas nada batia o efeito choque do seu som: um synth-pop espalhafatoso, esmagadoramente alegre para uns, absolutamente pindérico para outros. Mas o que interessava é que não passavam despercebidos.
Outro choque com que os vendedores de discos se familiarizaram chama-se Richard Clayderman, o pianista do registo erudito light que decorou ambientes amorosos com versões de clássicos que terão provocado algumas voltas nas tumbas de alguns dos seus compositores históricos. Ninguém se vai esquecer dos fraques de Clayderman com laçarote, do seu cabelinho loiro de tigela, nem dos fundos brancos das suas capas de discos.
Texto publicado no Cotonete.
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário